Não fazia sentido lutar. Seus melhores amigos haviam morrido, o sangue deles ainda estava grudado em seu uniforme, em sua pele...
Como tudo havia começado pouco importava. De súbito compreendera ser estupidez lutar e matar pessoas. Fosse qual fosse o motivo, nada deveria ser mais importante que a vida.
Todos os homens e mulheres mortos ao seu redor por pior que fossem não mereciam morrer assim; assassinados!
Tomou sua decisão, não mataria mais ninguém!
Suas mãos já estavam manchadas demais com o sangue alheio!
Se alguém quisesse continuar matando não era problema dele, sua decisão seria inabalável.
Lembrou – se de quando era um simples garoto matriculado num colégio qualquer antes de toda aquela loucura começar. Tudo o que ele queria era um pouco de aventura e uma grana a mais pra comprar um pouco mais de “erva”.
Todos seus amigos alistaram – se para defender a Pátria e matar um pouco de bandidos de um outro País qualquer.
-- Quem é o inimigo?
-- Sei lá, atira em quem tiver uniforme diferente do nosso!
Essa foram as ordens recebidas.
-- Matem todo mundo, depois vamos pegar tudo o que tiver valor e mostrar para as mulheres deles o que é um homem de verdade!
-- Como assim, por que matar as crianças também?
-- Filho de inimigo é inimigo também.
Seu olhar denotava desespero e nojo de si mesmo e de todos os que como ele vivam matando os outros, inimigos da Pátria ou não.
Sua idade? Talvez vinte anos ou menos, pois o rosto envelhecido pelo horror de matar ou morrer esconderia para sempre sua verdadeira aparência.
Pato fora seu último amigo a tombar inerte aos seus pés, um pedaço de seu cérebro, despedaçado por um tiro de grosso calibre, ainda estava grudado em sua farda desgastada pelas pesadas lutas que faziam parte da guerra. Suas lágrimas estavam misturadas ao sangue de vários amigos mortos, ao seu suor e ao próprio sangue.
Sua “erva” já não acalmava os pesadelos, os medos e o ódio pelo absurdo de matar para viver e impor os desejos de sua Pátria à Pátria dos inimigos. Ele só queria poder matar quem o transformara em um morto ambulante, um matador bem mandado, que não fora mandado para questionar e sim para morrer ou matar pela Pátria e os ideais dela, mesmo que não fossem os seus.
Ouviu passos furtivos aproximando – se de onde estava fumando seu “baseado”, pouco lhe importava se eram passos amigos ou inimigos, talvez fosse melhor morrer que matar. Pelo menos os mortos deveriam estar em paz e longe do medo das balas adversárias e, o que é bem pior, do medo da consciência que eternamente lhe cobraria pelas mortes que pesavam em seus ombros.
Os passos não eram de um inimigo ou de um amigo, eram de um garoto assustado e faminto. No rosto do garoto estava estampado o quanto a guerra é cruel. Ele perdera ambas as vistas e tateava pelas paredes destruídas pelas granadas em busca de ajuda e de comida.
O matador de homens chorou mais uma vez ao ver o resultado da luta entre “Pátrias”, pois aquele garoto que nem sabia o que é “Pátria”, perdera a visão e todo seu futuro, pois ou morreria de fome ou despedaçado por uma bomba.
Deu um pouco de sua comida ao garoto, lavou seu rosto e providenciou ataduras para a pequena face marcada para sempre. O garoto não se lembrava de seu nome, só do apelido que lhe deram; Pato.
As lágrimas o garoto não podia ver mas ouvia perfeitamente os soluços de seu benfeitor ao ouvir seu apelido.
O nascer do Sol acordou o matador de homens, ao seu lado estava sua nova e única missão naquela estúpida guerra; o garoto, que seria mantido vivo custasse o que custasse.
Mas o garoto amanhecera morto, não resistindo aos ferimentos sofridos. Seu rosto inerte tinha a serenidade de quem partiu sentindo gratidão.
O matador de homens também preferiu morrer a continuar matando e foi embora para outra vida, onde pediria perdão a todos que matara nesta.
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